O Deus das Moscas (e da selvajaria gratuita)
Após ler dois capítulos deste livro, que nem é assim tão grande quanto isso, decidi-me ficar por ali, visto que já passava da meia-noite, e ir dormir. De manhã, depois do pequeno almoço, peguei novamente no livro e continuei a minha leitura. É meu costume só largar um livro (salvo raras exceções em que o livro é, efetivamente, ou uma valente poia, ou uma valente pasmaceira) quando o acabo ou por motivos de força maior, por exemplo: a invasão dos comunistas, um ataque cardíaco, o apocalipse, ou ter sono. Assim que umas horas depois acabei o livro, fechei-o e pousei-o sobre o meu colo, fiquei uns segundos a processar e disse: “Credo!”
Antes de falar do livro propriamente dito, falarei um pouco (ou muito) sobre como o conheci.
Numa aula de inglês, cuja professora é das professoras mais fofinhas que conheço, daquelas que dá para um aluno gostar de, que se via que gostava do que fazia, e que mais importante do que isso me deu um vinte, logo uma excelente professora, trouxe para a aula uma valente pilha de livros, e começou a espalhá-los pelas mesas. Acabado o espalhanço, a professora vira-se para nós e informa-nos que cada um de nós vai escolher um livro para ler (estavam todos, obviamente, em inglês) e apresentá-lo à turma. A própria apresentação era até consideravelmente mais agradável do que o costume falar de pé em frente ao quadro. Iríamos por as cadeiras todas em rodinha, voltadas para dentro, e falaríamos sentados, género histórias à volta da fogueira. Infelizmente, parece que é contra a lei atear um fogo na escola, mesmo que se ofereça um lugar ao senhor agente. Enfim. Quando a professora nos acabou de informar sobre o que iríamos fazer, deixou-nos levantar e ir escolher o livro. E deixou-nos levantar e escolher o livro sem qualquer restrição, tipo, um de cada vez, ou lotaria, porque sendo alunos do décimo primeiro ano, sabia que tínhamos maturidade suficiente para não discutir na eventualidade de duas pessoas quererem o mesmo livro. Mentira. Era mesmo porque ninguém queria saber dos livros ou gostava de ler, só queriam mesmo era uma notinha decente no fim do período. Excetuando, claro, aqui o vosso amigo que gosta muito de ler e… Não, era mesmo só eu. Esta juventude está perdida. Bom, desde que vira a professora a espalhar os livros que já tinha um na mira, "1984" de George Orwell, um excelente livro do qual só não falo aqui porque já faz muito tempo que o li. Era suposto irmos lendo em casa e em certas aulas que a professora ia reservando ao longo do período para o efeito, mas confesso (quando é com orgulho pode-se usar o termo confessar?) que ao fim de três dias de o ter em casa já o tinha terminado. Não consigo pousar um livro a meio, o que faz com que rendam pouco, pelo menos na componente temporal. Portanto na primeira aula de leitura não tinha nada para ler. Felizmente, tinha um amigo na mesma situação, não porque gostasse de ler tanto que tinha lido o seu livro logo, mas porque gosta de despachar as coisas. Assim que passei as aulas de leitura não a ler o meu livro, mas sim a ler "Brave New World" de Aldous Huxley. Li-o todo nas aulas de leitura, e que grandes aulas essas foram. Calhavam a uma terça à tarde, que era o dia mais preenchido do nosso horário, em que saíamos mais tarde da escola, começando o dia com educação física para ficar logo cansado, e tendo a seguir a inglês noventa minutos de filosofia, quando ninguém tinha paciência para matemática de primeiro ano quanto mais para as grandes questões não empíricas da vida (pequeno disclaimer só para dizer que apreciei bastante a disciplina de filosofia, talvez mais do que qualquer outra). Aqueles noventa minutos de leitura ao início da tarde, nas horas de maior calor era bem vindos para uma pessoa descontrair um bocado. Eram daquelas tardes de primavera que mais parecia verão, tão comuns nesse ano, e estava toda a gente esparramada nas cadeiras, o sol a atravessar os cortinados meio opacos, e como grande parte da turma tinha tido autorização para ir ler para a rua, acompanhados da professora, a sala tinha poucas pessoas e estávamos à vontade. E é de notar que realmente ficamos lá sozinhos e a ler, meninos responsáveis que éramos (somos?). Enfim, nunca tive aula mais agradável em tantos anos de escola e duvido que alguma vez volte a ter semelhante situação. Acabei nessas aulas o livro “Brave New World”, do qual também devia falar um dia, e pedi à namorada do amigo que me emprestara o livro o seu. Este era "Lord of the Flies" ("O Deus das Moscas", sim o do título). Tinha-me despertado o interesse ao contar-me como era traumatizante e que era tudo selvagens, mais uns pormenores da história dos quais só falarei mais à frente que tem de haver organização textual e este não é o parágrafo em que falo sobre a história do livro. Infelizmente, na altura só tive tempo para ler as primeiras páginas, visto que o comecei a ler no dia das apresentações, no qual teríamos de devolver os livros à professora. Até acredito que se lhe pedisse ela me emprestasse, mas por alguma razão, nunca o fiz. Assim que fiquei com a sensação de quem andou a cheirar pizza mas não sujou o dente. Com vontade de ir lá acabar o serviço. Há um mês (contando do dia em que escrevo isto, meados de Agosto de 2018, que não é o dia em que publico), estava numa barraquinha que tinha sido montada na praça da vila do Algarve onde costumo passar férias, que servia como livraria, e quando estava prestes a ir embora de mãos vazias, visto que dos livros disponíveis, ou já tinha lido, ou não eram minimamente apelativos, quando reparo num livro, por incrível coincidência e acaso do destino, colocado entre uma cópia de “1984” e “Brave New World” (ambas em português, desta feita, embora não me lembre que nome fora dado ao segundo livro, daí usar aqui o original”), livro esse o “Deus das Moscas”. Esquecendo a suspeita ocorrência cósmica que foi a disposição desses três livros específicos, peguei na divindade mosca e comprei-o. Não o li na altura, porque ainda andava a ler Lovecraft, do qual falei na última vez que escrevi. Depois viajei para o estrangeiro, e finalmente de volta, li o livro, e como podem depreender da introdução, deixou mossa na alma. [rant] Mais mossa na alma deixou o facto de que estava longe do computador, por isso noventa por cento deste texto foi escrito num telemóvel. A experiência foi traumatizante e se puder nunca a repito. O corretor automático é um demónio vindo do sétimo inferno para me atormentar. [/rant]
Numa aula de inglês, cuja professora é das professoras mais fofinhas que conheço, daquelas que dá para um aluno gostar de, que se via que gostava do que fazia, e que mais importante do que isso me deu um vinte, logo uma excelente professora, trouxe para a aula uma valente pilha de livros, e começou a espalhá-los pelas mesas. Acabado o espalhanço, a professora vira-se para nós e informa-nos que cada um de nós vai escolher um livro para ler (estavam todos, obviamente, em inglês) e apresentá-lo à turma. A própria apresentação era até consideravelmente mais agradável do que o costume falar de pé em frente ao quadro. Iríamos por as cadeiras todas em rodinha, voltadas para dentro, e falaríamos sentados, género histórias à volta da fogueira. Infelizmente, parece que é contra a lei atear um fogo na escola, mesmo que se ofereça um lugar ao senhor agente. Enfim. Quando a professora nos acabou de informar sobre o que iríamos fazer, deixou-nos levantar e ir escolher o livro. E deixou-nos levantar e escolher o livro sem qualquer restrição, tipo, um de cada vez, ou lotaria, porque sendo alunos do décimo primeiro ano, sabia que tínhamos maturidade suficiente para não discutir na eventualidade de duas pessoas quererem o mesmo livro. Mentira. Era mesmo porque ninguém queria saber dos livros ou gostava de ler, só queriam mesmo era uma notinha decente no fim do período. Excetuando, claro, aqui o vosso amigo que gosta muito de ler e… Não, era mesmo só eu. Esta juventude está perdida. Bom, desde que vira a professora a espalhar os livros que já tinha um na mira, "1984" de George Orwell, um excelente livro do qual só não falo aqui porque já faz muito tempo que o li. Era suposto irmos lendo em casa e em certas aulas que a professora ia reservando ao longo do período para o efeito, mas confesso (quando é com orgulho pode-se usar o termo confessar?) que ao fim de três dias de o ter em casa já o tinha terminado. Não consigo pousar um livro a meio, o que faz com que rendam pouco, pelo menos na componente temporal. Portanto na primeira aula de leitura não tinha nada para ler. Felizmente, tinha um amigo na mesma situação, não porque gostasse de ler tanto que tinha lido o seu livro logo, mas porque gosta de despachar as coisas. Assim que passei as aulas de leitura não a ler o meu livro, mas sim a ler "Brave New World" de Aldous Huxley. Li-o todo nas aulas de leitura, e que grandes aulas essas foram. Calhavam a uma terça à tarde, que era o dia mais preenchido do nosso horário, em que saíamos mais tarde da escola, começando o dia com educação física para ficar logo cansado, e tendo a seguir a inglês noventa minutos de filosofia, quando ninguém tinha paciência para matemática de primeiro ano quanto mais para as grandes questões não empíricas da vida (pequeno disclaimer só para dizer que apreciei bastante a disciplina de filosofia, talvez mais do que qualquer outra). Aqueles noventa minutos de leitura ao início da tarde, nas horas de maior calor era bem vindos para uma pessoa descontrair um bocado. Eram daquelas tardes de primavera que mais parecia verão, tão comuns nesse ano, e estava toda a gente esparramada nas cadeiras, o sol a atravessar os cortinados meio opacos, e como grande parte da turma tinha tido autorização para ir ler para a rua, acompanhados da professora, a sala tinha poucas pessoas e estávamos à vontade. E é de notar que realmente ficamos lá sozinhos e a ler, meninos responsáveis que éramos (somos?). Enfim, nunca tive aula mais agradável em tantos anos de escola e duvido que alguma vez volte a ter semelhante situação. Acabei nessas aulas o livro “Brave New World”, do qual também devia falar um dia, e pedi à namorada do amigo que me emprestara o livro o seu. Este era "Lord of the Flies" ("O Deus das Moscas", sim o do título). Tinha-me despertado o interesse ao contar-me como era traumatizante e que era tudo selvagens, mais uns pormenores da história dos quais só falarei mais à frente que tem de haver organização textual e este não é o parágrafo em que falo sobre a história do livro. Infelizmente, na altura só tive tempo para ler as primeiras páginas, visto que o comecei a ler no dia das apresentações, no qual teríamos de devolver os livros à professora. Até acredito que se lhe pedisse ela me emprestasse, mas por alguma razão, nunca o fiz. Assim que fiquei com a sensação de quem andou a cheirar pizza mas não sujou o dente. Com vontade de ir lá acabar o serviço. Há um mês (contando do dia em que escrevo isto, meados de Agosto de 2018, que não é o dia em que publico), estava numa barraquinha que tinha sido montada na praça da vila do Algarve onde costumo passar férias, que servia como livraria, e quando estava prestes a ir embora de mãos vazias, visto que dos livros disponíveis, ou já tinha lido, ou não eram minimamente apelativos, quando reparo num livro, por incrível coincidência e acaso do destino, colocado entre uma cópia de “1984” e “Brave New World” (ambas em português, desta feita, embora não me lembre que nome fora dado ao segundo livro, daí usar aqui o original”), livro esse o “Deus das Moscas”. Esquecendo a suspeita ocorrência cósmica que foi a disposição desses três livros específicos, peguei na divindade mosca e comprei-o. Não o li na altura, porque ainda andava a ler Lovecraft, do qual falei na última vez que escrevi. Depois viajei para o estrangeiro, e finalmente de volta, li o livro, e como podem depreender da introdução, deixou mossa na alma. [rant] Mais mossa na alma deixou o facto de que estava longe do computador, por isso noventa por cento deste texto foi escrito num telemóvel. A experiência foi traumatizante e se puder nunca a repito. O corretor automático é um demónio vindo do sétimo inferno para me atormentar. [/rant]
Antes de passar à história do livro, deixem-me situar-vos na História, com "H" maiúsculo. Segundo o prefácio, escrito por Pedro Mexia, esta obra foi escrita na altura em que veio a público o que tinha acontecido no holocausto e em Hiroshima e Nagasaki. Basicamente, talvez o momento na história, mais do que qualquer outro até então (porque hoje em dia, graças à Internet já nem se tenta esconder e isto faz parte do nosso dia-a-dia), em que era bastante natural uma pessoa ficar com a ideia de que isto da humanidade afinal não é tão bom quanto vinha no folheto. Andamos nós aí a fazer de civilizados, e vai-se a ver e somos uns valentes animais. Por exemplo: as filmagens de pessoas dos estados unidos na black friday. Com tal introdução, suponho que estejam à espera de um livro sobre unicórnios fofinhos.
Agora sim, fale-se do livro. A história começa muito normal e idêntica a tantas outras. Vai o aviãozinho, por obra do destino cai, e ficam os passageiros sobreviventes (porque autoridade morre sempre) a tentar desenvencilhar-se na ilha. A diferença aqui é que é tudo crianças, doze anos e abaixo. Além de que são todos rapazes. Segundo o autor, não há raparigas porque meter tensão sexual seria inevitável e ele não queria ter de andar a falar nisso. Os rapazes são bastantes, mas a maioria encaixa na categoria de miúdo pequeno (ou pelo menos mais pequeno, por volta dos seis anos) e esses basicamente não têm identidade individual, excepto uma ou duas exceções (chi, a redundância). Dos mais crescidos (doze anos, mais coisa, menos coisa), há também alguns que só lá estão para encher o cenário, mas todas as personagens "a sério" fazem parte desse grupo. Temos Ralph, líder do grupo, a personagem principal de história. Piggy, como o nome indica, o gordo do grupo. É também o mais inteligente , tem asma e precisa de óculos para ver, enfim, uma personagem muito clichê. O mundo acabaria se um dia o gajo com dois dedos de testa fosse saudável. Temos Simon, miúdo estranho e tímido, e Jack Merridew, rival de Ralph, com o qual anda sempre às turras. Há mais personagens com nome, mas não são relevantes o suficiente para merecerem menção.
Portanto lá começa o livro, com os miúdos a elegerem um chefe (Ralph) e a começarem a tentar sobreviver. Um ponto importante a referir é que o livro funciona tão bem porque o autor fez um excelente trabalho a capturar comportamento infantil. Por exemplo: quando é para construir abrigos, Ralph convoca um reunião e discursa sobre a sua necessidade. A miudagem fica toda excitada e constroem logo um abrigo todo pipi. O segundo abrigo foi construído por meia dúzia de miúdos, e o terceiro só por dois, que entretanto a criançada distraiu-se e foi brincar. Outro exemplo é quando perguntam o nome a Piggy e este responde "qualquer coisa desde que não me chamem Piggy, que era o que me chamavam na escola". Resultado, toda a gente lhe passa a chamar Piggy até ao fim da obra. Erro de caloiro. Outro exemplo é quando estavam para eleger um chefe. Sendo que se encontravam em situação onde poderiam morrer todos sem alguém que soubesse sobreviver no mato, Jack Merridew argumenta que deveria ser ele o chefe, e não mais nenhum, visto que, sendo chefe de coro, sabia cantar em dó maior. Isto sim, é o que é necessário para ser um excelente chefe. Saber cantar em dó maior. É por isso que Portugal não atinge o quinto império, ninguém se lembra de, em pleno período eleitoral, pedir aos candidatos para cantar. A CMTV devia fazer uma reportagem especial para descobrir se o Sócrates consegue cantar em dó maior. A TVI metia-se ao barulho com o reality show "achas que sabes cantar - presidents edition". Pronto acho que já espremi esta piada ao máximo. Peço desculpa. Continuando. Os miúdos acabam por escolher Ralph como chefe, por este se encontrar na posse de um búzio. Prioridades. À medida que o livro avança, espalha-se e populariza-se o rumor de que existe um monstro na ilha, após, na primeira reunião, um dos miúdos pequenos ter contado, assustado, como o vira, miúdo esse que nunca mais foi visto. O rumor causa um medo que vai crescendo gradualmente, e juntar medo a uma data de crianças sozinhas numa ilha é receita para coisas bonitas e agradáveis. Mentira. Os miúdos começam a discutir, alguns a perderem os parafusos da cabeça e um ou outro mantém-se relativamente são. Mas a maioria vai-se tornando progressivamente mais selvagem. Lá para o fim os miúdos são uns autênticos selvagens e aquilo mais parece um circo dos horrores do que uma simpática ilha. A sério, aquilo é um festival de selvajaria que nem vos digo. No meio dessa maluquice toda, há um momento de grande clarividência de um dos miúdos, talvez o mais avariado, que poderia ter salvo a sanidade de todos, se ao menos o tivessem ouvido. Claro que o ignoraram, são putos que acham que sabem o que estão a fazer. Querem um exemplo da selvajaria de alguns? Após matarem um porco, cortaram-lhe a cabeça, espetaram-na num pau, com a outra ponta enterrada na terra, e deixam-na ali, uma oferenda ao monstro, e puseram-se a dançar. Aliás, isto até é bastante civilizado comparado com o que eles fazem um pouco mais à frente, mas isso seria spoiler dos grandes, por isso leiam mas é o livro, não vai ser um texto da internet a fazer o que o livro levou tantas páginas para dizer. Última coisa acerca da história. A parte onde é justificado o título do livro (O Deus das Moscas) é a parte mais genuinamente creepy do livro. Gostava muito de falar sobre isso, mas tenho uma política de não estragar a leitura a quem ainda não leu as obras. Estar a explicar a cena requereria spoilers a torto e a direito.
E agora a parte divertida: a temática do livro, ou, por outras palavras, como os seres humanos são todos uns animais e andam aí com sociedade e lei a ver se disfarça.
Tal como já tinha dito antes, nesta história vê-se a degradação gradual da decência e ordem nos miúdos, até chegar ao ponto onde são completos selvagens com sede de sangue. Claro que se pode desculpar isso como sendo resultado de serem apenas crianças sem uma figura de autoridade. Mas podemos ter tanta certeza? Podemos ter a certeza de que adultos racionais seriam capazes de não ceder a impulsos instintivos, e manterem-se civilizados no meio da selva? É fácil ao leitor assegurar-se que se se encontrasse nessa situação, manteria a compostura e seria um exemplo a seguir, um líder. Mas falar é fácil. O autor prova, vezes sem conta, a sua capacidade de expor a natureza humana como algo que tende para o selvagem, impedida apenas pela lei e sociedade. É francamente assustador, também pelo que é descrito, mas especialmente pela falta de argumentos contra a ideia de que assim é a natureza humana. Basta ligarem o canal de notícias da vossa preferência para verem inúmeros exemplos do quão besta o homem sabe ser, e raramente são crianças. Há também outra ideia, sobre um tópico de recorrente debate, que encontrei perto do final, ideia esta que veio muito mais de mim do que do livro, embora não possa garantir que não foi essa a intenção do autor. Há uma certa altura do livro em que, pelos menos para mim, se começa a perder a esperança. A partir desse ponto, o único caminho à vista é para baixo. E eu, imaginando maneiras de lidar com a situação, caso estivesse lá, cheguei à aterradora conclusão que a única maneira de se estar totalmente seguro, seria através da morte dos "selvagens". Porque, afinal, como se lida com quem só quer sangue e violência, recusando-se a ver a razão? Isto estabelece um certo paralelismo a certas situações atuais, situações essas que deixam uma pessoa a pensar que a única maneira de as resolver, e impedir futuras semelhantes, seria através da exterminação de quem as intencionalmente provoca. Claro que não é assim tão eticamente fácil. Quem somos nós para acabar com a vida de outrem a favor da nossa? Notem que em legítima defesa é totalmente justificado. Mas fazer a decisão a sangue frio de matar alguém porque há o risco dessa pessoa se mover contra nós no futuro torna-nos tão selvagens como os miúdos do livro. O dilema da pena de morte é muito conhecido, e há por essa internet fora quem exponha os dois lados da moeda muito melhor do que eu. Eu só cá estou para relatar o que foi a minha experiência de ler este livro, não para debater ética. Pelo menos não agora; futuramente, quem sabe? Deixo apenas a informação que sou contra, pelo menos na altura em que escrevo isto. Talvez um dia mude de opinião. Talvez não.
Portanto deixo-vos com esta problemática, e com a garantia que este livro é de pôr a massa cinzenta a trabalhar. É também uma história interessante e realista (dentro dos limites razoáveis), sobre uns miúdos que se encontram presos numa ilha deserta. Finalmente, é um daqueles livros que facilmente se punham numa lista de "10 livros que você tem de ler antes de morrer" para depois uma tia qualquer partilhar no facebook.
Tal como já tinha dito antes, nesta história vê-se a degradação gradual da decência e ordem nos miúdos, até chegar ao ponto onde são completos selvagens com sede de sangue. Claro que se pode desculpar isso como sendo resultado de serem apenas crianças sem uma figura de autoridade. Mas podemos ter tanta certeza? Podemos ter a certeza de que adultos racionais seriam capazes de não ceder a impulsos instintivos, e manterem-se civilizados no meio da selva? É fácil ao leitor assegurar-se que se se encontrasse nessa situação, manteria a compostura e seria um exemplo a seguir, um líder. Mas falar é fácil. O autor prova, vezes sem conta, a sua capacidade de expor a natureza humana como algo que tende para o selvagem, impedida apenas pela lei e sociedade. É francamente assustador, também pelo que é descrito, mas especialmente pela falta de argumentos contra a ideia de que assim é a natureza humana. Basta ligarem o canal de notícias da vossa preferência para verem inúmeros exemplos do quão besta o homem sabe ser, e raramente são crianças. Há também outra ideia, sobre um tópico de recorrente debate, que encontrei perto do final, ideia esta que veio muito mais de mim do que do livro, embora não possa garantir que não foi essa a intenção do autor. Há uma certa altura do livro em que, pelos menos para mim, se começa a perder a esperança. A partir desse ponto, o único caminho à vista é para baixo. E eu, imaginando maneiras de lidar com a situação, caso estivesse lá, cheguei à aterradora conclusão que a única maneira de se estar totalmente seguro, seria através da morte dos "selvagens". Porque, afinal, como se lida com quem só quer sangue e violência, recusando-se a ver a razão? Isto estabelece um certo paralelismo a certas situações atuais, situações essas que deixam uma pessoa a pensar que a única maneira de as resolver, e impedir futuras semelhantes, seria através da exterminação de quem as intencionalmente provoca. Claro que não é assim tão eticamente fácil. Quem somos nós para acabar com a vida de outrem a favor da nossa? Notem que em legítima defesa é totalmente justificado. Mas fazer a decisão a sangue frio de matar alguém porque há o risco dessa pessoa se mover contra nós no futuro torna-nos tão selvagens como os miúdos do livro. O dilema da pena de morte é muito conhecido, e há por essa internet fora quem exponha os dois lados da moeda muito melhor do que eu. Eu só cá estou para relatar o que foi a minha experiência de ler este livro, não para debater ética. Pelo menos não agora; futuramente, quem sabe? Deixo apenas a informação que sou contra, pelo menos na altura em que escrevo isto. Talvez um dia mude de opinião. Talvez não.
Portanto deixo-vos com esta problemática, e com a garantia que este livro é de pôr a massa cinzenta a trabalhar. É também uma história interessante e realista (dentro dos limites razoáveis), sobre uns miúdos que se encontram presos numa ilha deserta. Finalmente, é um daqueles livros que facilmente se punham numa lista de "10 livros que você tem de ler antes de morrer" para depois uma tia qualquer partilhar no facebook.
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